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Obama, go home! O anti-americanismo e o romantismo nostálgico da Guerra Fria.


Durante os jogos da última Copa do Mundo, disputada na África do Sul, no ano passado, me lembro que, a certa altura li, entre diversas mensagens postadas no Twitter, uma, que serviu de base para a inspiração deste texto. Na ocasião, a seleção dos EUA acabara de ser eliminada por Gana, em Rustenburgo, em partida válida pelas oitavas de final daquela competição. E o comentário foi o seguinte:

“Bem feito para esses caras (os jogadores dos EUA)! Odeio esse país!”

A frase, que a primeira vista soa apenas como uma bravata de torcida no futebol, onde teoricamente sempre se torce pelo time mais fraco (se bem que nesse caso específico, seria difícil apontar o mais fraco), é emblemática por diversos sentidos. Um deles, o mais latente, confirma o sentimento que, desde os estertores da Guerra Fria, e que principalmente ganhou força na década de 1980, diante da agressiva política externa estadunidense, primeiro com o presidente Ronald Reagan à frente e depois com George Bush – ambos do Partido Republicano -, o anti-americanismo ainda vive entre nós, sejamos latino-americanos, africanos ou asiáticos. Até mesmo em alguns países europeus, é possível perceber isso, e pasmem, há correntes até mesmo dentro dos EUA contrárias a essas políticas.

É comum sempre a voz rouca das ruas incidir nesse tipo de comportamento. Seja por razões ideológicas ou simplesmente porque uma pessoa ouve alguém gritar “Yankees, Go Home!” e resolve gritar também, mesmo que, na maioria das vezes, não saiba o motivo de estar gritando aquilo. Em muitos casos, o anti-americanismo acontece também porque é “cult” ser “de esquerda” e ter repulsa por tudo que diz respeito ser da “América”. Ser contrário aos EUA já foi moda, principalmente nos anos 1980 e até mesmo meados dos anos 1990. Mas depois meio que perdeu a graça.

Não queremos aqui julgar a política dos EUA. Certamente que na maior parte dos episódios em que aquele país esteve envolvido militarmente, com ações em outros países, não foi por causa da “missão salvacionista” que eles acham ter perante o mundo, de libertar o povo de ditaduras sanguinárias, instaurando a paz e a democracia. É claro que interesses políticos e econômicos estão ali inseridos. Foi assim em 1964, quando ocorreu o golpe civil-militar que depôs o então presidente João Goulart e instaurou uma ditadura que esteve por 21 anos no poder no Brasil – é importante ressaltar que os EUA não estiveram militarmente envolvidos naquele golpe, mas apoiaram, seja financeiramente o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e alguns sindicatos, em favor de se disseminar um sentimento contrário ao governo Jango; foi assim em 1973, no Chile, de Salvador Allende, quando os EUA externaram simpatia à ascensão do general Augusto Pinochet ao poder; foi assim na chancela à Operação Condor, onde formou-se uma coalizão de países – Brasil, Argentina, Chile, Uruguai e Paraguai – que trocavam informações sobre exilados políticos, movimentos subversivos, entre outros; foi assim na guerra entre a extinta União Soviética (URSS) e o Afeganistão, em 1979 (quando a CIA treinou, financiou e forneceu armas a um certo Osama Bin Laden, para vencer uma já decadente URSS, trôpega e moralmente afetada por uma crise econômica interna – e que culminaria com o solapamento do regime socialista alguns anos depois.); foi assim também quando a CIA investiu e treinou o exército iraquiano de… Saddam Hussein, na guerra entre Irã e Iraque – só para citar alguns exemplos.

No entanto, ter sentimento de rejeição ou ojeriza a algo deve ser analisado. Principalmente quando há alternância de poder num país, onde partidos políticos possuem distintas plataformas de governo e posicionamentos políticos. Historicamente a política estadunidense sempre se pautou na alternância entre Republicanos e Democratas no poder. Nessa onda, em alguns momentos aquele país contou com agressiva política externa e comercial, noutros momentos uma política mais reservada e protecionista da economia. Tradicionalmente os Democratas (partido de Barack Obama, atual presidente) sempre agiram mais em defesa da economia dos EUA, criando inúmeras barreiras alfandegárias contra a entrada de produtos externos, o que não acontecia muito com os Republicanos.

Antes de generalizar os EUA, é preciso entender o contexto e cada situação em que estiveram envolvidos com politicamente externa. O que levou o democrata John Kennedy a querer intervir em Cuba (a famosa invasão da Baía dos Porcos, em 1961)? O que levou ao recrudescimento do alerta estadunidense no Brasil, com a política nacionalista de Jango? A resposta é clara: a revolução cubana, ocorrida em 1959 – e o medo de que o Brasil, neste ultimo caso, se tornasse uma nova Cuba. Mas o mesmo partido Democrata teve um presidente que era a favor dos Direitos Humanos (Jimmy Carter) e que bateu de frente com o governo Geisel, levando a um estremecimento de relações com o Brasil, em 1977. Até hoje Carter é lembrado pelo ativismo político na causa pelos direitos humanos, contrário a ditaduras. Então percebemos que toda e qualquer generalização é equivocada.

O presidente Barack Obama é o primeiro negro a ocupar a Casa Branca. Enfrenta problemas internos nos EUA, como o desemprego e o questionamento de suas políticas sociais. Ao ordenar a ação militar na Líbia, não faz somente por questões humanitárias, decerto. Mas atende a interesses econômicos – não necessariamente dele, mas de grandes grupos petrolíferos e também da opinião pública conservadora – Obama chegou até a ser rotulado de “socialista” por esses grupos. Essa ação visa, provavelmente, a seu interesse em se reeleger, contando com o apoio destes grupos.

Deveríamos então caprichar na repulsa e discriminação à sua visita ao Brasil? Não. Sua visita foi histórica. Não é todo dia que temos a oportunidade de ver um presidente dos EUA, visitando nossa cidade. E é sempre agregador escutar o que um chefe de Estado tem a dizer. Quem acha o contrário, intimamente é a favor de algum tipo de ditadura, que cerceie o ponto de vista alheio. Os manifestantes que jogaram pedras e atiraram um coquetel Molotov em cima de um segurança do consulado dos EUA, no Rio, certamente defendem apenas seus pontos de vista, não interessando o que o “outro” pensa. Provavelmente sentem saudades da ditadura stalinista, onde ninguém podia discordar do establishment soviético – e caso o fizessem, seriam mortos ou deportados para trabalhos forçados na Sibéria.

A visita de Obama é mais do que emblemática. Representa algo além do interesse estadunidense no pré-sal brasileiro. Representa a confirmação de que os EUA vêem o Brasil como parceiro estratégico nesta década que se inicia – seja no petróleo, nas telecomunicações ou na economia. Representa o respeito que eles têm pela nova presidente, Dilma Roussef, que com seu estilo de governar, agrada mais que o ex-presidente Lula, que optava mais pela fanfarronice do que propriamente pela discrição – que Dilma esbanja nos primeiros meses de governo. E descerra a cortina de uma nova maturidade política do governo brasileiro: uma ex-guerrilheira, perseguida pela ditadura, senta na mesma mesa que um presidente dos EUA para negociar.

Isso não quer dizer nada?

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